Como entender a Patagônia

 

Quem busca desvendar o sul do mundo por via terrestre, tem que estar pronto para muitas horas no vasto vazio, para conseguir alcançar os destinos. Também para a rotina de cruzar fronteiras da Argentina e Chile, se não tem paciência, é melhor seguir o roteiro por mar ou pelo ar. Mas garanto que é incrível observar o exílio em planícies de grandes distâncias, com o contraste de lagos esmeraldas, vulcões, bosques e neves eternas entre os picos nevados da Cordilheira do Andes. Parecia que sempre estávamos vendo uma paisagem dessas de revistas ou quadros.

Para terem noção do tamanho da Patagônia, é quase um país dentro de dois países. De Bariloche até Ushuaia são 2.200km, a mesma distância entre Brasília e Porto Alegre. Só no território da Argentina, a Patagônia ocupa 1/3 de toda a área do país, as populações das cidades, comparadas com algumas das cidade com mais de 100 mil habitantes na América do Sul, mostra como a região patagônica está isolada. No mapa abaixo em que marcamos com os círculos vermelhos as proporções das populações das cidades, podemos visualizar o quanto é pequena a população desse pedaço do mundo.

 

 

Neste fim de mundo, o que há para fazer é apreciar a natureza. Quando chegamos pela manhã em Puerto Varas, encontramos uma cidade deserta, mercearias, farmácias e lojas fechadas. A sorte foi ter encontrado uma loja de turismo aberta, programando um passeio até o vulcão Osorno. No final da tarde, ao voltarmos para o centro da cidade, estava coberto de gente, estavam em algum tipo de comemoração, onde muitos jovens se divertiam com música eletrônica e alguns DJ´s fazendo uma festa, parecia ser outra cidade.

De lá atravessamos a Cordilheira, observando os lagos andinos até Bariloche, esta região é conhecida como o ´jardim da patagônia`, tem rosas por todos os lados. Um trecho muito turístico, por ser mais próximo aos polos demográficos, boa estrutura, território montanhoso com visual alpino, no inverno mais conhecido como Brasiloche, devido à grande quantidade de turistas brasileiros. A colonização germânica na região influência muito no charme, fomos no verão e pretendemos voltar no inverno, quando deve ser ainda mais lindo.

A paisagem muda totalmente, quando descemos a Ruta 40 até Punta Arenas, por infinitas estradas que alternam entre asfalto, rípio e terra batida. São territórios vastos, não há casas ou carros e muito menos sinal de celular, só há o silencio que se interrompe pelo ventos que chegam a 120km/h. Um enorme pampa, uma planície infinita com vegetação rasteira, que o céu parece dominar. Acredito que o título de fim do mundo surgiu ao percorrer essas terras, com dificuldades colocadas por longas distancias em climas extensos.

As diferentes paisagens são resultado da barreira formada pela Cordilheira – fronteira entre os países, que muda as paisagens, com floresta abundante e lagos sobre ela, separa as vertentes pacífica e atlântica e antártica, retendo a umidade trazida dos ventos do sul, deixando a parte norte praticamente desprovida de umidade.

Depois de percorrer dois dias pelo vazio num ônibus com apenas uma parada, chegamos na grande Punta Arenas, com seu centro conservado, lembrando seus tempos de glória- quando as importações passavam por lá ao invés do Panamá. Punta Arenas foi para nós uma grande cidade, com poucas pessoas e muito frio! Foi nossa base para comprar passagens para o Ushuaia e Puerto Natales.

Não conseguíamos muitas informações na internet de Puerto Natales, foi uma surpresa, era pequena como relatavam, mas era fascinante ver tantos mochileiros do mundo inteiro no mesmo lugar, sentimento parecido do que vi (Sabrina) em Aguas Calientes – escala para Machu Picchu. Todos esses sonhadores em busca de ver El Calafate com umas vistas incríveis que são difíceis de descrever e Perito Moreno com aquelas geleiras que fazem nós acreditarmos que estamos na Antártida. Puerto Natales uma pequena cidade que serviu para irmos para El Calafate e El Chaltén, ambas na província de Santa Cruz

Mas queríamos ir até o fim, no extremo sul do continente, o Ushuaia. Muito diferente do que idealizamos, não é um vilarejo como Puerto Natales, de frente para o Canal Beagle – onde navegaram Darwin e Fitz Roy há mais de 180 anos, é uma cidade portuária que tem o comércio aberto praticamente só quando chegam os transatlânticos.

Resultado da dificuldade do transporte para o extremo sul, estão os preços mais caros, porém também aumentam os salários e o custo de vida. As pessoas do norte rumam ao sul em busca de trabalho e de uma vida melhor, sem distinção em ser cidade chilena ou argentina, com frio e vento impõe uma vida dentro de portas fechadas, como em cafés, partilham grande parte do tempo e geram relações mais fortes.  Já para o restante do país, esse sentimento é direcionado aos chilenos por ter sido braço direito dos ingleses na famosa guerra das Malvinas Quando se fala de argentino para chileno e vice versa, há uma rivalidade e desprezo evidentes, patriotismo.

Sem nada, lugar nenhum, vazio e fim do mundo é assim que é apelidada a Patagônia, principalmente o Ushuaia, quando chegamos e no dia seguinte, a cidade estava vazia, por não ter nenhum cruzeiro atracado no cais, a cidade turística para. Mas a alegria de chegar num lugar tão longe, faz com que todos fiquem procurando imagens que possam imortalizar o momento que foram ao fim do mundo, quase sempre com placas do município.

A região patagônica se caracteriza por vastíssimas extensões abandonadas, com controvérsia de terras de petróleo e áreas de pobreza. Também pode se ver como o começo do mundo, onde está vazio para se completar, ou, repensar se o modelo que temos na nossa cidade é o ideal.


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